Segundo Jacques Aumont, o surgimento do cinema promoveu uma dinamização do modo de olhar, não apenas pelo fato de as imagens cinematográficas captarem o movimento pela primeira vez, mas também por elas potencializarem a variação de pontos de vista, enquadramentos, ângulos e distâncias. Devido a essa dinamização, que será desenvolvida sobretudo com as técnicas de montagem, a linguagem cinematográfica pode ser caracterizada como multiperspéctica. Com base em tais pressupostos, o presente artigo procura investigar como a multiplicidade de perspectivas instaurada pela “sétima arte†foi incorporada pela literatura, manifestação artÃstica com que o cinema sempre estabeleceu profÃcuos diálogos. Conforme será evidenciado, a estrutura diegética de obras literárias torna-se dinâmica na medida em que apresenta vários narradores, cada um dos quais detentor de um ponto de vista. No âmbito da literatura brasileira, ressalta-se, neste artigo, o multiperspectivismo narrativo em Relato de um certo Oriente, de Milton Hatoum, romance em que há cinco narradores, cujos discursos são organizados de modo semelhante à montagem invertida desenvolvida pelo cinema.