ESTÁGIO PROBATÓRIO: QUESTÕES CONTROVERSAS

Revista de Direito Administrativo e Infraestrutura | RDAI

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Editor Chefe: Alexandre Godoy Dotta
Início Publicação: 04/05/2017
Periodicidade: Trimestral
Área de Estudo: Ciências Sociais Aplicadas, Área de Estudo: Direito, Área de Estudo: Planejamento urbano e regional, Área de Estudo: Engenharias

ESTÁGIO PROBATÓRIO: QUESTÕES CONTROVERSAS

Ano: 2019 | Volume: 3 | Número: 10
Autores: Paulo Modesto
Autor Correspondente: Paulo Modesto | [email protected]

Palavras-chave: estágio probatório, estágio de confirmação, período de avaliação, adaptação, treinamento em efetivo, exercício profissional

Resumos Cadastrados

Resumo Português:

Denomina-se1 tradicionalmente estágio probatório, ou estágio de confirmação, o período de avaliação, adaptação e treinamento em efetivo exercício a que estão submetidos os que ingressam em cargos públicos em virtude de aprovação em concurso público.

Trata-se de período de experiência, supervisionado pela Administração, destinado a verificar a real adequação de agentes públicos ocupantes de cargos de provimento efetivo ou de provimento vitalício na primeira fase da relação funcional que encetam com o Estado. Neste lapso de tempo, atualmente limitado para os agentes civis ao máximo de três anos2, busca-se avaliar a retidão moral, a aptidão para a função, a disciplina, a responsabilidade, a assiduidade, a dedicação e a eficiência dos agentes empossados e em exercício, mediante observações e inspeções regulares. Neste período, além disso, deve a Administração velar pelo treinamento e adaptação dos novos integrantes da organização pública, selecionados a partir de concurso público.

Os agentes aprovados ao final do período de estágio probatório adquirem, conforme o caso, a estabilidade ou a vitaliciedade nos quadros de pessoal dos órgãos e entidades estatais. Mas já iniciam o período de estágio probatório detendo o status de agentes públicos. Os agentes reprovados no estágio probatório, respeitado o contraditório e a ampla defesa, são exonerados dos cargos que exerciam.

É verdade que, não faz muito tempo, diversos autores consideravam o estágio probatório uma simples fase do processo de seleção ou concurso3, uma oportunidade para a autoridade completar o processo de seleção4.

À vista destas noções, discutiu-se largamente a respeito da situação jurídica do pessoal em estágio probatório, afirmando alguns a sua condição de “quase funcionário”5, “um agente administrativo em condição sui generis, com todos os deveres e responsabilidades impostos pelo regime jurídico a que se acha submetido, mas sem os direitos integralmente conferidos aos efetivos, em situação de maior segurança”.6

Esta orientação doutrinária, entretanto, merece reparos, pois confunde o estágio probatório com o estágio experimental previsto em alguns concursos públicos como uma das etapas do processo seletivo.7 O estágio probatório não é etapa do concurso público, não colhe candidatos a cargos públicos, pois tem vez apenas com a finalização dos processos de seleção, após a nomeação dos aprovados, a posse e o ingresso em exercício dos novos agentes públicos. O estágio probatório não se qualifica como processo concorrencial, eliminatório, de índole coletiva, mas como processo de verificação da adaptação individual dos agentes recém ingressos no serviço público. Além disso, a condição de “quase-funcionários” é incompatível com a situação jurídica de agentes no pleno exercício de suas funções, pois a lei não ressalva a estes as prerrogativas e sujeições reconhecidas aos demais agentes públicos, salvo unicamente as vantagens ou garantias incompatíveis com a sua situação precária8.

O agente em estágio probatório não é um interino, um ocupante transitório do cargo, ou um agente instável, temporário, investido em cargo de confiança, dispensável ao arbítrio da administração, mas o titular de um plexo de atribuições e deveres públicos. A precariedade de sua condição diz respeito apenas a sua plena integração no cargo isolado ou de carreira (efetivação), pois esta integração depende de sua confirmação ao final do estágio probatório. Mas a investidura do agente em cargo de provimento efetivo ou vitalício9, completada com a posse, preenche o cargo, provê o cargo, que deixa de estar vago. É dizer: o agente em estágio probatório é titular provisório do cargo público que exercita, com as prerrogativas e sujeições inerentes ao cargo, ressalvadas apenas aquelas que decorram da ausência de estabilidade ou vitaliciedade no serviço público. Não foi ainda efetivado, integrado em caráter definitivo no complexo de funções que exercita,

o que vem ocorrer apenas com a aquisição da estabilidade ou vitaliciedade10. Nada obstante, o agente em estágio probatório não pode acumular cargos públicos, nem exercer atividade incompatível com o cargo que titulariza, pois ocupa o cargo em que foi investido, ainda que sem estabilidade, assumindo os encargos desta condição11.

A dificuldade inicia quando é necessário precisar quais são as vantagens, garantias e prerrogativas compatíveis com a peculiar situação dos agentes em estágio probatório. Esses agentes são disciplinados por normas especiais e podem usufruir apenas parcialmente do regime jurídico comum dos demais agentes públicos. Mas as normas especiais são frequentemente limitadas, restringindo-se quase inteiramente a disciplinar o processo de avaliação do servidor em estágio. A lacuna normativa que remanesce é significativa e deixa em situação de indefinição uma parte relevante do regime jurídico a aplicar aos agentes em estágio probatório.

Em termos interrogativos, fica-se a indagar: Quais as normas do regime jurídico comum dos agentes públicos são compatíveis com a peculiar situação dos agentes em período de estágio probatório? Como deve ser computado o período de efetivo exercício durante o estágio probatório? Quais as licenças, os afastamentos, as hipóteses de provimento derivado e de afastamentos do serviço, previstas no regime geral, compatíveis com a exigência constitucional de avaliação em efetivo exercício dos novos agentes públicos? Quais as garantias dos agentes em estágio no período de avaliação? Essas são

perguntas inevitáveis, mas geralmente sem resposta normativa explícita e, lamentavelmente, também com limitadas indicações jurisprudenciais e doutrinárias pertinentes.

A consequência desse estado de coisas é um expressivo número de questões controvertidas a respeito do estágio probatório. Muitas não são questões novas, mas apenas agora ganharam urgência, depois das alterações produzidas no regime jurídico do estágio probatório pela Emenda Constitucional nº. 19, de 1998. Antes da Emenda Constitucional, o estágio probatório era considerado na prática um simples lapso de tempo, dissociado de qualquer avaliação efetiva ou da análise de sua eficácia jurídica específica, transcorrendo quase sempre sem qualquer repercussão na vida funcional dos agentes públicos. Era um simples obstáculo burocrático12, uma etapa da vida funcional dos agentes, vencida frequentemente pelo mero decurso de prazo13.

A Emenda Constitucional nº 19 alterou essa situação mediante diversas providências normativas: (a) ampliou o estágio probatório dos servidores públicos para três anos; (b) tornou evidente a aplicação restrita do estágio probatório e da garantia da estabilidade unicamente aos ocupantes de cargos efetivos nomeados após concurso público14; (c) impôs como condição para aquisição da estabilidade, pelo servidor em exercício de cargo efetivo, a concreta realização de avaliação especial de desempenho durante o estágio probatório por comissão instituída para essa finalidade15.

A Emenda Constitucional n. 19 não dispensou de avaliação especial de desempenho nem mesmo os servidores com estágio probatório em curso na data da promulgação da alteração constitucional (art. 28 da Emenda).

Essas providências buscaram impedir que o estágio probatório continuasse a ser uma simples exigência formal, sem efetividade como processo de avaliação e adaptação dos agentes públicos à atividade normal do Estado. Mas as alterações somente serão concretizadas se forem bem compreendidas e se houver vontade política e administrativa de implementá-las em termos apropriados. Essa compreensão, no entanto, é impossível sem o enfrentamento dos aspectos controversos do tema, ainda que de forma sumária. É o propósito deste trabalho.

 

 

II CARACTERIZAÇÃO E ALCANCE DO CONCEITO DE ESTÁGIO PROBATÓRIO

a) Estágio Probatório: situação jurídica funcional e processo administrativo

O estágio probatório não é simples lapso de tempo. Na verdade, o estágio probatório merece ser caracterizado, por um lado, como um momento da relação jurídica funcional (perspectiva estática) e, por outro, como um específico processo administrativo (perspectiva dinâmica).

O Estado e o servidor são sujeitos de direito na relação jurídica funcional. São centros de imputação de direitos e deveres. O estágio probatório é uma fase no desenvolvimento dessa relação jurídica funcional, traduzindo um complexo de situações jurídicas distintas, que o particularizam.

O estágio probatório, em primeiro lugar, diz respeito ao momento inicial da relação jurídica funcional. Somente é possível caracterizá-lo conferindo a sua repercussão no vínculo jurídico que une o servidor ao Estado e confrontando as situações que encerra com as situações jurídicas que o desenvolvimento da relação funcional propicia. Essa repercussão é o verdadeiro centro da reflexão, o objeto a analisar, não o fato do transcurso do tempo.

Mas o estágio também pode ser percebido como um específico processo administrativo. Pode ser caracterizado como o processo administrativo deavaliação, adaptação e treinamento em efetivo exercício a que estãosubmetidos os que ingressam em cargos públicos em virtude deaprovação em concurso público. O ato final do processo de estágio probatório é a confirmação do servidor ou o seu desligamento do serviço.

b) Alcance subjetivo do instituto

Não se cogita de estágio probatório, ao menos com as características desse instituto do direito administrativo, para os agentes contratados para empregos públicos, para os nomeados para cargos em comissão, de livre designação e destituição, e para os nomeados para cargos de provimento condicionado ou desligamento condicionado, designados mediante processos especiais estabelecidos pela lei ou diretamente previstos pela Constituição16.

Também não se exigiu estágio probatório aos agentes contemplados com a estabilidade excepcional concedida pelo art. 19 e 53 do ADCT (LGL\1988\31)17.

c) Alcance objetivo do instituto

O estágio probatório vincula-se, inexoravelmente, à garantia da estabilidade ou da vitaliciedade, sendo pressuposto para a aquisição dessas garantias funcionais18. Somente é exigível de agentes que as possam adquirir de forma permanente, sem vinculação a qualquer mandato temporário, após concurso público. Por isso, objetivamente, o instituto é aplicado apenas para os cargos de provimento efetivo ou vitalício, vocacionados a incorporar agentes de modo definitivo, após vencido o período de prova, adaptação ou avaliação do estágio de confirmação.

Nas hipóteses em que a Constituição reconhece as garantias da estabilidade, ou da vitaliciedade, mas dispensa concurso público, não se cogita de estágio probatório.

Não há estágio probatório, por exemplo, para os nomeados a cargos de Ministros ou Conselheiros de Tribunais de Contas, Desembargadores, Ministros dos Tribunais Superiores, entre outros agentes a que a Constituição autorizou o provimento originário sem concurso público e atribuiu, ao exercente, as garantias da vitaliciedade ou da estabilidade.

Neste diapasão, assentou o Supremo Tribunal Federal:

“Funcionário público. Cargo isolado. Não se pode falar em estágio probatório quando a nomeação foi feita sem concurso. Não aplicação da sumula 21. Recurso conhecido e provido. (STF, RE 63138, MG, Segunda Turma, Relator: Min. ADAUCTO CARDOSO, data do julgamento 17/04/1969, RTJ VOL-00051-01, PG-00125).

d) Estágio Probatório e Efetivo Exercício

Questão sensível é saber o que deve ser entendido como efetivo exercício para fins de estágio probatório.

O problema pode ser sintetizado nos seguintes termos: a Constituição Federal exige, para a aquisição da estabilidade ou vitaliciedade, cumprimento de período de prova em efetivo exercício, a realização de um processo de avaliação durante determinado período de exercício, mas não determina o modo de contagem deste exercício. Tradicionalmente, para fins de aposentadoria, disponibilidade, adicional por tempo de serviço, entre outras hipóteses, a lei ordinária tem reconhecido como de “efetivo exercício” situações funcionais diversas, a exemplo dos períodos transcorridos no gozo de licença-gestante, licença-prêmio, férias, afastamentos para desempenho de mandato classista ou exercício de mandato eletivo. Nestes casos, como é evidente, a lei cria uma ficção, reconhecendo como de exercício efetivo um lapso de tempo em que faltou a prestação real de serviço. Pode a lei também computar um período de tempo de exercício ficto para fins de atendimento da exigência constitucional relativamente ao período de estágio probatório? Se houver impedimento constitucional, esse obstáculo admite exceções? Não sendo possível a contagem de tempo ficto, isto significa que o agente público deve contabilizar no período de estágio probatório apenas os dias de trabalho na

repartição, excluindo os feriados, fins de semana, os períodos de paralisação em razão de greve, os dias de luto e os períodos de férias?

A questão é mais intrigante do que aparenta, pois, se de um lado o diploma constitucional exige cumprimento de certo período de efetivo exercício para aquisição da estabilidade ou vitaliciedade, por outro reconhece ao agente em estágio probatório direitos que somente podem ser fruídos com afastamento do exercício efetivo da função. Os exemplos mais singelos são os dias de repouso semanal remunerado (CF (LGL\1988\3), art. 39, §3º, combinado com art. 7º, XV), o período de férias (CF (LGL\1988\3), art.39, §3º, combinado com art. 7º, XVII), o período de licença à gestante (CF (LGL\1988\3), art.39, §3º, combinado com art. 7º, XVIII) e os dias de licença-paternidade (CF (LGL\1988\3), art.39, §3º, combinado com art. 7º, XIX).

Na matéria, observou com acuidade o Prof. CARLOS ARI SUNDFELD, em estudo de mérito19, que a Constituição se contentou em referir apenas o simples exercício, sem adjetivá-lo de efetivo, quando cuidou da aposentadoria por tempo de serviço (art. 40, antes da Emenda Constitucional 20/98 (LGL\1998\68)), quando desejou computar o tempo de mandato eletivo de vereador não remunerado para fins de aposentadoria (ADCT (LGL\1988\31), art. 8º, §4º) e ao conceder a estabilidade excepcional aos servidores em exercício (art. 19 do ADCT (LGL\1988\31)). Essa forma de expressão do constituinte, autêntica opção, permitiu ao legislador a construção de ficções (tempo ficto). Porém, diversamente, quando disciplinou o estágio probatório, a lei fundamental, desde a sua versão original, impunha condicionamento mais exigente, referindo explicitamente a tempo de serviço efetivo e não simplesmente a exercício.

Sem dúvida, a exigência de efetivo exercício, ou exercício real da função, não deve ser ociosa no diploma constitucional. Para precisar os limites de uso do conceito de efetivo exercício, no entanto, deve-se aprofundar a finalidade de sua exigência ante a própria finalidade do estágio probatório.

Neste sentido, após a Emenda Constitucional n. 19/98 (LGL\1998\67), a teleologia do período de confirmação parece ainda mais evidente: o estágio probatório destina-se a avaliar, de forma concreta, a adaptação ao serviço e as qualidades do agente aprovado em concurso público, após a sua investidura em cargo de provimento efetivo.

Não fora assim, não teria sentido a exigência, imposta à Administração, de constituir uma comissão com a única finalidade de efetuar a “avaliação especial do desempenho” dos servidores em estágio probatório (CF (LGL\1988\3), art. 41, §4º.).

Ora, é evidente o prejuízo para a “avaliação especial de desempenho” de afastamentos, licenças ou outra qualquer modificação da situação funcional dos agentes recém-ingressados que importe, durante o período de prova, em dispensa do desempenho regular da função.

Em princípio, portanto, em uma inicial delimitação do conceito de efetivo exercício, deve-se reputar como inconstitucionais todas as ficções previstas em lei, convertendo artificialmente períodos de afastamento do serviço em períodos de efetivo exercício para fins de integralização do estágio probatório.

O conceito de efetivo exercício é um conceito-realidade, expressão que utilizo recordando figura conhecida do direito do trabalho (contrato-realidade). Repele ficções, construções artificiais, burlas ao propósito constitucional de realizar a avaliação dos servidores no desempenho concreto da atividade funcional.

Mas qual o conteúdo deste conceito? Ele se confunde com a rotina, os dias de expediente nas repartições públicas? Penso que não.

Entendo que a melhor caminho para determinar o conceito de efetivo exercício durante o período de prova é inserir o servidor durante o processo de estágio probatório na atividade regular do Estado.

Neste sentido, será de serviço efetivo o tempo em que o servidor exercita a sua função integrado na atividade normal da Administração, entendendo-se esse exercício tanto o período de dedicação direta às funções do cargo quanto o período no qual o servidor em estágio probatório permaneça à disposição da administração, à semelhança dos demais servidores, para o desempenho de suas funções20. O efetivo exercício é o exercício possível nos períodos de atividade regular do serviço e nos marcos do regime normal de trabalho dos servidores em geral.

Tempo de exercício efetivo é o tempo dedicado à administração, tenha ou não esta expediente de trabalho. Havendo expediente, o tempo de efetivo exercício conta-se em serviço, porque há serviço. Não havendo expediente, por determinação legal, que alcance à generalidade dos agentes, há mera disponibilidade para o serviço, o único exercício possível neste contexto para qualquer servidor, inclusive o servidor em estágio. Por isso, deve ser reconhecido como efetivo exercício, para fins de integralização do estágio probatório, o descanso semanal remunerado, os dias de feriado, bem como todos os dias de inatividade que alcancem generalizadamente os servidores da administração.

É frequente que a lei trate como ficção inclusive esses períodos de inatividade normal da administração. Não importa. Não será ficção, mas efetivo exercício, sem qualquer burla ao texto constitucional.

Não deve ser computado no estágio probatório, porém, o período transcorrido em razão de situações específicas, particulares, que afastem de modo especial (individualizado) o agente do serviço quando há serviço, isto é, quando existe funcionamento normal da administração pública. Exemplos: afastamentos em razão de serviço militar, licença para trato de assunto particular, desempenho de mandato classista, licença gestante, exercício de mandato eletivo, afastamentos em razão de casamento, luto, acidente ou doença21.

O direito a férias anuais constitui situação à parte. O gozo de férias pelo agente em estágio probatório não ocorre em situação de inatividade geral da administração, salvo a hipótese de férias coletivas, mas tampouco caracteriza situação peculiar, particular ou individualizada do agente em período de prova. As férias constituem direito reconhecido a todos os trabalhadores, ocupantes de cargos ou empregos (CF (LGL\1988\3), art. 7º, XVII, c/c art. 39, §3º) e que todos devem poder gozar. Trata-se de período que deve também ser considerado como de efetivo exercício, uma vez que o servidor usufrui um direito constitucional reconhecido a todos os agentes públicos, segundo uma programação definida pela própria Administração, e permanece à disposição da administração, sem particularizar a sua situação de afastamento em face dos demais agentes públicos.

Mas, não se deve perder de vista que, conforme vem especificando a jurisprudência, o tempo de exercício efetivo a ser computado é o tempo de exercício em cargo de provimento efetivo específico, não sendo considerado o tempo de serviço prestado em outro cargo, da mesma ou de outra entidade. Tampouco deve ser considerado no cálculo do tempo de efetivo exercício de agente investido em cargo efetivo o tempo de serviço prestado por ele em outra condição jurídica, como agente temporário, contratado, ocupante de função, ainda que o cargo tenha sofrido posterior transformação em cargo de provimento efetivo22. Além disso, ainda quando legítima a reintegração, após anulação do ato de demissão que haja colhido agente em estágio probatório, não se conta para fins do estágio probatório o período em que o agente não estava no desempenho de suas funções.

Assim, em resumo, não deve ser computado no estágio probatório:

a) licenças, afastamentos e outras hipóteses de ausência ao serviço referenciadas unicamente na situação peculiar dos agentes em estágio, quando houver funcionamento normal da administração pública;

b) períodos de tempo ficto, artificialmente construídos por lei ordinária;

c) o período de serviço prestado a outra pessoa ou entidade pública, para o mesmo ou outro cargo;

d) o período de serviço prestado à mesma pessoa ou entidade pública, relativamente a outro cargo público;

e) o período de serviço prestado à mesma pessoa ou entidade pública, relativamente ao mesmo cargo, porém como interino, substituto, prestador de serviços ou ocupante de função de confiança, antes da transformação da natureza do cargo;

f) o período transcorrido entre demissão do serviço e o reconhecimento da reintegração, por vício de legalidade no ato sancionador23.

e) Estágio Probatório e Avaliação de Desempenho

A avaliação de desempenho durante o estágio probatório é especial, obrigatória e realizada por comissão instituída para essa finalidade.

É especial porque não se confunde com a avaliação normal de desempenho, realizada periodicamente pela Administração, voltada a aferir a qualidade da atuação de servidores estáveis. A avaliação no estágio probatório é avaliação global do período de prova, embora não seja obrigatoriamente concentrada num único momento, podendo ser desdobrada em etapas, de modo a captar a evolução do agente ao longo do tempo e suas dificuldades de adaptação.

É obrigatória, pois não pode ser dispensada, nem admite a inércia da Administração, tendo sido eliminada do sistema constitucional a hipótese de aquisição da estabilidade por simples decurso de prazo. O servidor é também interessado na avaliação. Se não efetuada, não há aquisição da estabilidade. Logo, atualmente a avaliação traduz dever da Administração Pública e direito subjetivo do servidor, exigível inclusive perante o Poder Judiciário.

Não pode o Judiciário, porém, substituindo-se ao administrador, conceder estabilidade ao servidor em estágio probatório ante a omissão da Administração, eliminando a utilidade da avaliação especial de desempenho. Mas pode condenar a Administração em multa diária, nas situações de atraso injustificado, responsabilizar os agentes faltosos ou o agente faltoso, caso eventualmente sequer tenha sido nomeada comissão de avaliação, ou adotar medida de proteção que antecipe, de forma precária, mas efetiva, alguns efeitos da estabilidade ainda não adquirida.

Esta última hipótese foi pioneiramente sugerida entre nós por JUAREZ FREITAS, em termos genéricos, mas consistentes, em artigo de mérito, nos seguintes termos:

“Transcorrido largo lapso temporal sem atendimento da demanda, lícito até admitir, por exceção, que o Poder Judiciário possa equipará-lo, para vários efeitos, ao estável. Ainda neste caso, no entanto, tratar-se-á de mera equiparação parcial, porque a bem do rigor, não será estável o servidor sem que tenha sido avaliado favoravelmente”24.

A hipótese não é acadêmica e pode ser explorada a partir de situações práticas. Pense-se na situação de agentes que, esgotado o prazo constitucional, sem avaliação ou aquisição da estabilidade, são surpreendidos durante a inércia da administração com a extinção de seus cargos ou a declaração da sua desnecessidade (art. 41, §3º.). Em tese, como é assente no direito brasileiro, o agente em estágio probatório não está protegido contra a extinção de cargo ou a declaração de sua desnecessidade, sendo trivial admitir como consequência dessas medidas a exoneração do agente ainda não estabilizado. Ocorre que na hipótese figurada, em princípio, o agente deveria ter sido avaliado e, ante o fato, eventualmente conquistado a estabilidade, permanecendo então em disponibilidade. Neste caso, diante da violação do direito à avaliação e à conclusão do estágio probatório, por inércia da Administração, deve-se reconhecer aos agentes atingidos a possibilidade de permanecerem em disponibilidade condicional até a conclusão da avaliação do estágio probatório, permanecendo em disponibilidade, após a conclusão do estágio, apenas aqueles que receberem avaliação positiva da Administração25.

A norma constitucional impõe ainda que a avaliação seja feita por comissão, recusando validade à ação fiscalizadora exclusiva do chefe imediato ou superior hierárquico. A comissão deve ser integrada apenas por agentes estáveis. A construção é, aqui, em tudo similar àquela elaborada pela jurisprudência para assegurar a imparcialidade das comissões disciplinares. Somente agentes estáveis contam com necessária neutralidade para avaliar agentes em estágio probatório.

O curso da avaliação de desempenho pode ser interrompido a qualquer tempo, antes mesmo do advento dos três anos, quando o servidor houver praticado ato desabonador ou ainda fato previsto como infração administrativa. O estágio probatório não impede a realização, pela Administração, de processos disciplinares, nem obriga a Administração, em qualquer caso, a suportar durante três anos o agente faltoso nos seus quadros.

O servidor em estágio probatório pode ser demitido, sempre que pratique ato previsto como infração funcional. A demissão pode ser modo de terminação abrupta do estágio probatório. Não dever haver, nestes casos, simples exoneração, pois a primeira importa em juízo de censura ausente na simples exoneração. Ademais, conforme a lei regente, em certas hipóteses a demissão importa em impedimento para a investidura em novo cargo público (ex. art. 137 da Lei 8.112/90 (LGL\1990\46), que incompatibiliza o servidor demitido para nova investidura em cargo público federal durante 5 anos, desde que infringidas duas proibições que identifica). A simples exoneração não autoriza este efeito.

 

 

III SITUAÇÕES JURÍDICAS FUNCIONAIS E ESTÁGIO PROBATÓRIO: Questões Controversas

a) Possibilidade de promoção no curso do estágio probatório

Promoção é forma de provimento derivado. É modo de conferir a alguém a titularidade de um cargo, mas pressupõe relação jurídica-funcional preexistente. Na promoção o servidor, ou o agente, ascende de um cargo para outro na mesma carreira. Conforme seja estruturada a carreira, a promoção pode admitir uma gradação horizontal e outra vertical, assim como apenas uma dessas espécies.

O servidor em estágio probatório é servidor titular de competências, integrante de uma carreira, tem direito à carreira, mesmo que sua estabilidade ou vitaliciedade nela seja dependente de futura confirmação. Mas é titular transitório, sem fixidez, sem definitividade. Diante desse fato, é comum indagar: cabe a sua promoção na carreira?

Respondo afirmativamente. Em diversas situações surgem vagas na carreira que não podem ser supridas senão com a promoção de servidores em estágio probatório. Foi o que ocorreu quando da implantação dos Ministério Públicos dos territórios federais transformados em Estados ou criados pela Constituição de 1988 (CF (LGL\1988\3), ADCT (LGL\1988\31), art. 13 e 14), uma vez que o estatuto fundamental exige que “as funções do Ministério Público só podem ser exercidas por integrantes da carreira” (CF (LGL\1988\3), art. 129, §2º, primeira parte).

Certo, a lei pode limitar a promoção, tratando de forma explícita do tema, restringindo a candidatura ou a escolha de servidores no curso do processo de estágio probatório até certo limite26. Mas, se a lei não o fizer, não há impedimento constitucional algum a promoção de agentes em estágio probatório, pois esses agentes são agentes públicos, titulares de competências públicas, vinculados ao exercício de uma função permanente do Estado27.

Sendo assim, no entanto, é usual indagar: a promoção de agente público em estágio probatório importa em terminação do estágio probatório ou equivale a ato tácito de sua confirmação antes dos três anos de exercício do cargo?

Entendo que a resposta deve ser negativa, nas duas hipóteses. Não se alegue que o agente promovido por merecimento estaria desde logo “julgado”, considerado apto para o exercício do mister, avaliado quanto ao cumprimento dos requisitos necessários para recomendar a sua efetivação no cargo e a sua permanência na carreira. Durante o período do estágio probatório a Administração sempre poderá, quando verificar fato incompatível com o exercício profissional ou que indique inaptidão para o exercício da função, recusar efetivação e confirmação ao agente, observada a exigência de fundamentação. A promoção, por si só, não tem o condão de conferir estabilidade ou vitaliciedade ao agente em estágio probatório.

É certo que o desligamento dos agentes eventualmente não confirmados, mas anteriormente promovidos, demandará fundamentação reforçada. Exige-se da Administração coerência com os seus atos anteriores (proibição de "venire contra factum proprium")28. O precedente administrativo aberto com a promoção, entretanto, não impede a alteração do juízo de merecimento e aptidão do agente público por ocasião da avaliação final do estágio probatório, quer sob o fundamento de ocorrência de “fato superveniente” à promoção, quer sob o fundamento de “ignorância ou erro de informações sobre fatos anteriores”. No entanto, estas serão hipóteses raras, exigentes de fundamentação detida e individualizada.

b) Designação do Agente em Estágio Probatório para Cargo de Confiança

Tem-se discutido sobre a designação de agentes em estágio probatório para cargos de confiança. Os Tribunais de Contas têm enfrentado a hipótese, admitindo a possibilidade29.

Analiso o problema em duas partes. Não reconheço impedimento algum à nomeação de agentes em estágio probatório para cargos de confiança, mas não admito a contagem do tempo de serviço prestado no exercício do cargo de livre designação e exoneração para o fim de cálculo do tempo necessário a completar o estágio probatório. O prazo deve ser suspenso, voltando a ser contabilizado apenas com o retorno do servidor ao cargo efetivo.

DIOGENES GASPARINI manifesta-se em sentido divergente ao exposto. Segundo o autor, dadas as finalidades do estágio probatório, não é possível, “ainda que lei a regulamente, a designação ou nomeação do servidor em estágio probatório para exercer outro cargo, e muito menos entendemos viável seu comissionamento em outra entidade. O afastamento do servidor do efetivo exercício do cargo efetivo, durante o estágio probatório, impede a necessária verificação de sua aptidão para o exercício das atribuições do cargo que titulariza”30.

O argumento, embora respeitável, não convence. Confunde a possibilidade de comissionamento (que é recusada pelo autor citado) com o problema da avaliação no cargo efetivo (que pode ser suspensa). Havendo suspensão, não há prejuízo algum para a avaliação exigida pelo estágio probatório, que reiniciará quando houver retorno do servidor ao seu cargo efetivo.

É certo que a matéria é entregue à lei, que pode autorizar ou não a suspensão do período do estágio, a partir da aceitação pelo servidor da designação para o cargo comissionado. Mas a hipótese não pode ser considerada inviável de forma liminar31.

c) Remuneração do Agente em Estágio Probatório

Não deve ser admitida a redução de remuneração dos agentes em estágio probatório. Ressalvada a hipótese de existir cargo destinado especialmente aos agentes em período de estágio, a remuneração de agente em período de estágio deve ser idêntica à remuneração dos exercentes das mesmas funções que já tenham adquirido a estabilidade.

É possível admitir redução, ou remuneração parcial, apenas para hipóteses de estágio experimental, cursos de formação, que colham indivíduos ainda no curso de concursos públicos.

d) Estágio Probatório e Estabilidade Sindical

O Supremo Tribunal Federal enfrentou a questão da compatibilidade da concessão da estabilidade sindical a servidores em estágio probatório.

Tratou a questão sob dois prismas. Numa primeira linha de decisão, considerou a estabilidade sindical incompatível com o regime jurídico administrativo de todos os servidores estatutário e, consequentemente, dos servidores em estágio probatório. Numa segunda linha de argumentação, negou igualmente o reconhecimento da “estabilidade sindical” por incompatibilidade com o “estágio probatório”, entendendo que a admissão da estabilidade durante o estágio probatório importaria em “supressão” do estágio32.

As duas orientações, como parece evidente, embora afastem o reconhecimento da estabilidade sindical, não recusam a possibilidade de concessão de licença para desempenho de mandato classista durante o estágio probatório. Se houver deferimento deste tipo de licença, porém, como vimos, deve ser suspensa a contagem do período de efetivo exercício para processo de avaliação a que está sujeito o servidor licenciado.

e) O Momento da Confirmação do Servidor

Discutiu-se durante algum tempo sobre quando deveria ser realizada a avaliação de desempenho durante o estágio probatório. As orientações se dividiram: alguns entenderam que a avaliação final somente seria válida se realizada antes do término do prazo constitucional de prova (período de efetivo exercício em avaliação)33; outros entenderam que o período de efetivo exercício previsto na lei fundamental deveria ser integralmente considerado na avaliação do estágio probatório34.

A questão, embora não tenha perdido relevo, hoje desperta menor interesse porque não se pode cogitar mais de aquisição de estabilidade por decurso de prazo ou, por igual, em esgotamento do processo de estágio probatório pelo simples transcurso do tempo.

Antes da Emenda Constitucional n. 19/98 (LGL\1998\67), especialmente em decisões mais antigas, a primeira orientação era predominante35. Porém, com a consideração de situações concretas variadas, houve lenta evolução para a segunda orientação, flexibilizando-se o limite máximo do estágio, exigindo-se para a validade do ato final de avaliação que o processo de apuração da aptidão do agente fosse iniciado durante o prazo constitucional do estágio36.

A exigência intransponível de avaliação no curso do estágio probatório, que a rigor impõe a própria redefinição do estágio como um processo de avaliação e adaptação do agente nomeado por cargo efetivo, após o concurso público, tornou anacrônica a discussão sobre o prazo fatal de avaliação. Hoje há direito à avaliação, exigível pelo servidor, e dever de realizar avaliação, imposto ao administrador público.

O transbordamento do prazo constitucional para avaliação é omissão ilegítima, mas não autoriza a aquisição da estabilidade “de ofício”, pois atualmente o servidor permanecerá sem adquirir a estabilidade até a efetiva conclusão do processo. Os danos que essa situação provocar, tendo causa jurídica na omissão de agentes públicos, poderão ensejar responsabilidade patrimonial do poder público e responsabilidade funcional e patrimonial dos agentes que lhe deram origem. A omissão ilegítima pode estimular a impetração de ações coletivas ou individuais, mas nunca autorizar a dispensa de condição constitucional para a aquisição da estabilidade ou vitaliciedade.

Vimos antes, ainda, que a omissão ilegítima pode autorizar o reconhecimento de medidas de proteção especial aos agentes sem estágio concluído ante situações de extinção do cargo ou declaração de sua necessidade. Nestes casos, pode ser deferida o que denominei estabilidade condicional, como forma de acautelar situações jurídicas até a conclusão do processo de avaliação com a confirmação do agente ou sua exoneração.

f) O Desligamento do Servidor em Estágio Probatório

É antiga a orientação jurisprudencial que reconhece aos agentes em estágio probatório o direito ao devido processo, especialmente ao contraditório e à ampla defesa.

Dispõem as Súmulas 20 (MIX\2010\1745) e 21 (MIX\2010\1746) do Supremo Tribunal Federal:

“Súmula 20 – É necessário processo administrativo, com ampla defesa, para demissão de funcionário admitido por concurso.”

“Súmula 21 – Funcionário em estágio probatório não pode ser exonerado nem demitido sem inquérito ou sem as formalidades legais de apuração de sua capacidade.”

É conhecido também o magistério de HELY LOPES MEIRELLES sobre o assunto:

“O que os Tribunais vêm sustentando e com inteira razão é que a exoneração na fase probatória não é arbitrária, nem imotivada. Deve basear-se em motivos e fatos reais que revelem inaptidão ou desídia do servidor em observação, defeitos, esses, apuráveis e comprováveis pelos meios administrativos consentâneos (ficha de ponto, anotações na folha de serviço, investigações regulares sobre a conduta no trabalho, etc.), sem o formalismo de um processo disciplinar. O necessário é que a Administração justifique, com base em fatos reais, a exoneração, como, afinal, sumulou o STF, nestes termos: ‘Funcionário em estágio probatório não pode ser exonerado nem demitido sem inquérito ou sem as formalidades legais de apuração de sua capacidade’ (Súmula 21)”.

É preciso cautela, no entanto, na leitura do trecho citado. O fato do estágio probatório não corresponder a processo disciplinar não significa que não importe em processo administrativo, exigente de bilateralidade, contraditório e ampla defesa. Se ninguém pode ser privado de sua liberdade e bens sem o devido processo legal (art. 5o, LIV, CF (LGL\1988\3)) e se, como reza a lei maior, aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, como os meios e recursos a ela inerentes (art. 5º, LV, CF (LGL\1988\3)), não é possível admitir como juridicamente válida decisão simplesmente motivada para o desligamento de agentes públicos, independente do estabelecimento prévio do contraditório.

Não merecem aplauso, pois, as seguintes decisões do Superior Tribunal de Justiça:

“Administrativo. Servidor público. Estágio probatório. Avaliação de desempenho insatisfatória. Investigação sumária. Exoneração. Legalidade. Princípio da hierarquia das normas. - Durante o estágio probatório, o servidor público não possui a garantia da estabilidade no serviço público, podendo ser exonerado desde que não demonstre os requisitos próprios para o exercício da função pública, tais como idoneidade moral, aptidão, disciplina, assiduidade, eficiência e outros, circunstância aferível por mera investigação sumária, desprovida do contraditório. - A instauração do procedimento de exoneração é efetuado mediante ato da autoridade administrativa competente que tome ciência do desempenho funcional insatisfatório do servidor, por representação oferecida por seu chefe imediato. - Antes da reforma introduzida pela Emenda Constitucional nº 19/98 (LGL\1998\67), a Carta Magna de 1988 estabelecia o prazo de dois anos para que o servidor público em estágio probatório alcançasse a garantia da estabilidade no serviço. - A redução do prazo para o encaminhamento da representação para fins de instauração do procedimento de exoneração por norma de caráter municipal importa em violação ao princípio constitucional da hierarquia das normas. - Recurso ordinário desprovido. (STJ, ROMS 10993, SP, Relator: Min. VICENTE LEAL, data de decisão: 04/04/2000, SEXTA TURMA, fonte: DJ DATA:15/05/2000 PG:00204).

“Administrativo. Recurso especial. Concurso público. Anulação. Fraude. Candidatos aprovados e nomeados. Exoneração. Ilegalidade. Inexistência. Súmula nº. 473, do STF. Embargos de declaração. Multa. Cabimento. Caráter procrastinatório. CPC (LGL\2015\1656), artigo 538, § único. - A exoneração de servidor público concursado em estágio probatório deve ser efetuada com observância do devido processo legal e do princípio da ampla defesa, desde que reconhecida a validade da nomeação para o cargo efetivo em que se logrou aprovação. - Constatada a realização de concurso público sob patentes pechas de irregularidades, aplica-se o pensamento construído no verbete da Súmula 473, do Colendo Supremo Tribunal Federal, que assegura à Administração Pública o poder de anular seus próprios atos, de ofício, quando eivados de ilegalidade, sem a necessidade de instauração do procedimento administrativo próprio. – É cabível a aplicação da multa processual prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC (LGL\2015\1656), se os embargos declaratórios mostram-se claramente protelatórios, mormente quando destinados à reapreciação do julgamento que se apresentou desfavorável ao interesse do embargante. - Recurso especial conhecido e provido. (STJ, RESP 243971, BA, Relator: Min. VICENTE LEAL, Sexta Turma, Data de Decisão: 09/05/2000, DJ DATA:29/05/2000 PG:00214).

Segundo o que dimana da lei fundamental, no entanto, o devido processo legal, assegurador da ampla defesa e do contraditório, deve ser garantido a todos os brasileiros, com ou sem estabilidade, durante o estágio probatório ou fora dele, havendo ou não arguição de ilegalidade no concurso público de ingresso. Havendo possibilidade de lesão a interesse, risco de prejuízo a bens jurídicos, acusação em geral, o devido processo, o contraditório e a ampla defesa são inescusáveis, sob pena de transgressão de garantia constitucional expressa.

Os Tribunais Superiores, registre-se, têm agasalhado essa orientação contemplada há muito tempo nas Súmulas 20 e 21 do STF cada vez com maior força, com maior nitidez, superando preconceitos e concepções anacrônicas. É fácil comprová-lo com algumas poucas referências:

"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. EXONERAÇÃO DE SERVIDORES CONCURSADOS. ESTÁGIO PROBATÓRIO. DEVIDO PROCESSO LEGAL. AMPLA DEFESA. 1. Os servidores públicos concursados, nomeados e empossados, que estejam em estágio probatório, gozam dos direitos constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa quando em processo de demissão ou exoneração. 2. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 3. Recurso provido. (STJ, ROMS 9408/SE; DJ DATA:18/12/2000, PG:00238, Relator(a) Min. HAMILTON CARVALHIDO, Data da Decisão 10/10/2000, Órgão Julgador T6 – SEXTA TURMA).

ADMINISTRATIVO - CONCURSO PUBLICO - CANCELAMENTO. É ilegal o ato de exoneração de servidores aprovados em concurso público, estando em estágio probatório, sem processo administrativo em que se assegure ampla defesa. recurso provido. (STJ, RESP 1970/MA, Relator Min. GARCIA VIEIRA, Data da Decisão 31/10/1990, DJ 26/11/1990, PG:13764, T1 - PRIMEIRA TURMA)

“Servidor estadual em estágio probatório: exoneração não precedida de procedimento específico, com observância do direito à ampla defesa e ao contraditório, como impõe a Súmula 21 - STF: nulidade. Nulidade da exoneração: efeitos. Reconhecida a nulidade da exoneração deve o servidor retornar à situação em que se encontrava antes do ato questionado, inclusive no que se refere ao tempo faltante para a complementação e avaliação regular do estágio probatório, fazendo jus ao pagamento da remuneração como se houvesse continuado no exercício do cargo; ressalva de entendimento pessoal do relator manifestado no julgamento do RE 247349." (STF, RE 222532/MG, rel. Min. SEPÚLVEDA PERCENTE, DJ 01/09/00).

'POLICIAL MILITAR. DISPENSA. ESTÁGIO PROBATÓRIO. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. O policial militar, conquanto em fase de estágio probatório, somente pode vir a ser desligado da Corporação mediante regular processo administrativo, em que lhe seja garantida a oportunidade de defender-se, utilizando-se, para tanto, de provas, sob a égide do contraditório. Recurso conhecido e provido.' A estabilidade dos servidores públicos militares, ao contrário do que ocorre com os servidores civis, é matéria afeta à lei ordinária, por força do disposto no art. 42, par. 9º, da CF (LGL\1988\3). “(STF, RE-230540/SP, Relator Ministro ILMAR GALVAO, DJ DATA-13-08-99 PP-00022, EMENTVOL-01958-08 PP-01634, Julgamento 20/04/1999 - Primeira Turma)

"AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DEMISSÃO DE SERVIDOR PÚBLICO NÃO ESTÁVEL. GARANTIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. INOBSERVÂNCIA. 1. Servidor público não estável. Demissão por motivo de conveniência administrativa e interesse público. Inexistência de processo administrativo. Nulidade do ato de dispensa por inobservância da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa. 2. Agravo regimental não provido." (STF, AGRRE 223927/MG, rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA)."

"EMENTA: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR EXONERADO NA FASE DO ESTÁGIO PROBATÓRIO. EXIGÊNCIA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO, COM OPORTUNIDADE PARA AMPLA DEFESA. Caso em que o acórdão, após exame da prova produzida, concluiu pela inobservância da formalidade. Recurso não conhecido." (STF, RE-228074 / SP, Relator Ministro ILMAR GALVAO, DJ DATA-06-08-99 PP-00050 EMENT VOL-01957-09 PP-01844 Julgamento 06/04/1999 - Primeira Turma)

Em alguns julgados os princípios expostos estão igualmente acolhidos, mas é utilizada terminologia diversa. Ao revés de processo administrativo, menciona-se “sindicância com ampla defesa”, restringindo-se a locução “processo administrativo” apenas aos processos disciplinares. Nestes casos, embora menor a precisão dos conceitos, também estão asseguradas as garantias constitucionais.

g) Perda ou desistência do estágio probatório e retorno ao cargo efetivo anteriormente ocupado

Questão interessante, ainda não tratada adequadamente, é o problema das consequências da perda ou desistência do estágio probatório.

A matéria parece simples: o servidor que desiste ou não recebe aprovação no estágio probatório é exonerado do cargo no qual era avaliado.

A Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990 (LGL\1990\46), no entanto, não se contentou em prever a exoneração. Diferenciou as consequências jurídicas da exoneração considerando o fato do agente avaliado (e inabilitado) ter ocupado cargo público como estável. Se o agente inabilitado não era servidor público estável, cabe-lhe apenas a exoneração. Se porventura ocupou cargo na condição de estável deve, segunda a lei, ser reconduzido ao cargo original ou, se este estiver ocupado, ser aproveitado em outro cargo.

A disciplina da situação é tecida por três disposições, enredadas umas nas outras, verbis:

"Art. 20. (….)

§ 2º O servidor não aprovado no estágio probatório será exonerado ou, se estável, reconduzido ao cargo anteriormente ocupado, observado o disposto no parágrafo único do art. 29.

Art. 29. Recondução é o retorno do servidor estável ao cargo anteriormente ocupado e decorrerá de:

I - inabilitação em estágio probatório relativo a outro cargo;

II - reintegração do anterior ocupante.

Parágrafo único. Encontrando-se provido o cargo de origem, o servidor será aproveitado em outro, observado o disposto no art. 30.

Art. 30 O retorno à atividade de servidor em disponibilidade far-se-á mediante aproveitamento obrigatório em cargo de atribuições e vencimentos compatíveis com o anteriormente ocupado."

A Lei 8.112/90 (LGL\1990\46) não disciplina a situação do servidor estável que, voluntariamente, resolve desligar-se do novo cargo no curso do estágio probatório.

Mas a lacuna recebeu preenchimento judicial. O Pleno do Colendo Supremo Tribunal Federal, em decisão integradora, deliberou aplicar os preceitos citados também para o desligamento voluntário de servidor estável. No caso, a situação apresentava peculiaridades, pois o agente havia se desligado de cargo da Imprensa Nacional (União) e ingressado em cargo de Agente de Polícia do Distrito Federal. Na ocasião, os ministros do Supremo Tribunal Federal contornaram o problema ao argumento de ser a polícia civil do Distrito Federal mantida pela União (art. 21, XIV, CF (LGL\1988\3))37.

A questão não parece tão simples. Pode-se questionar seriamente a constitucionalidade deste “direito ao regresso”. O §2o. do art. 20 é compatível com o princípio da igualdade e da exigência de concurso público para o ingresso em cargo público? O agente público sujeito a estágio probatório foi empossado no novo cargo, desligando-se do seu cargo de origem por decisão voluntária. É quase certo que os dois cargos não poderiam ser acumulados, seja em razão das funções, seja em razão da incompatibilidade de horários e houve necessidade de uma opção. O cargo vago foi objeto de novo concurso ou de promoção de servidor da carreira. Se o cargo integra estrutura administrativa de outra unidade da Federação, a decisão administrativa de uma unidade federativa não deve produzir efeitos sobre a outra, nem esta unidade federativa pode disciplinar os efeitos da desaprovação de seus agentes para outras unidades da Federação. Fica-se então a indagar: pode o legislador da União oferecer o benefício do “direito de regresso” unicamente a seus ex-servidores estáveis, ou das unidades administrativa que mantenha, dispensando-os de concurso público para novo ingresso? Entendo que não é possível a hipótese, em homenagem ao princípio da igual acessibilidade de todos aos cargos públicos, sem distinção, inclusive distinção decorrente da anterior situação funcional, bem como, por igual, da proibição do provimento derivado não decorrente do direito à carreira38. O princípio da igualdade restringe aqui a criatividade legislativa. É verdade que, consoante o art. 37, II, da CF (LGL\1988\3), os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei. Não se deve entender, porém, que a “disciplina de requisitos” possa encerrar disciplina que dispensa o próprio concurso público.

 

 

IV CONCLUSÃO

O estágio probatório não é simples lapso de tempo. Traduz o primeiro momento da relação jurídica-funcional de determinados agentes públicos com o Estado. Encerra um complexo de situações jurídicas marcadas pela condição ainda precária de agentes públicos empossados em cargos de provimento efetivo, depois de concurso público, mas já responsáveis por determinada esfera de atribuições estatais. O estágio pode também ser percebido como processo administrativo de avaliação e adaptação em efetivo exercício de agentes nomeados após concurso para cargos de provimento efetivo.

Este trabalho enfrentou diversos aspectos do tema, sem a pretensão do tratamento exaustivo. Mas as variadas situações consideradas, muitas delas ainda insuficientemente exploradas pela literatura jurídica, demonstram que o assunto merece renovada reflexão e maior desenvolvimento na doutrina jurídica e nos Tribunais. Antigos preconceitos merecem questionamento e novos problemas são colocados para discussão.

A releitura dos diversos aspectos problemáticos do tema deve partir, porém, de uma consideração simples: o agente empossado, submetido a processo de estágio probatório, detém status jurídico de agente público, as garantias do devido processo legal e goza dos mesmos direitos e deveres dos servidores estabilizados e efetivados, salvo aqueles que guardem incompatibilidade com a sua condição precária.

Tanto o servidor estável quanto o servidor em estágio probatório gozam do direito ao devido processo legal, com os direitos correlatos ao contraditório e à ampla defesa. O que particulariza a estabilidade, como bem definia PONTES DE MIRANDA, é a “indemissibilidade sem processo administrativo, em que se assegure ampla defesa, ou sem sentença judiciária, mais a garantia da disponibilidade, se se extingue o cargo”39. Vale dizer, é a fixidez, a titularidade definitiva de função, que protege o agente contra a extinção do cargo ou a declaração de sua desnecessidade. Não é o devido processo, ou a simples “indemissibilidade sem processo administrativo”, pois essa garantia a lei fundamental estendeu a todos os brasileiros (art. 5º, LIV e LV).

O desafio de hoje é dar efetividade à exigência constitucional do estágio probatório. Realizá-lo como processo administrativo contínuo, ordenado, garantidor dos direitos subjetivos dos agentes públicos, mas ao mesmo tempo capaz de depurar do resultado do concurso público realizado os agentes que realmente estão aptos ao desempenho de funções públicas. O estágio probatório não pode transcorrer mais como simples lapso de tempo ou ser percebido com excessiva estreiteza, como se nada significasse. O tempo dirá se o desafio foi aceito e se o instituto floresceu entre nós como merece.

1 Artigo originalmente publicado em: MODESTO, Paulo; MENDONÇA, Oscar (coord.). Direito do Estado: novos rumos – tomo 2. São Paulo: Max Limonad, 2001, p. 49-88.

2 A Emenda Constitucional n. 19, de 4 de junho de 1998, alterou o período de estágio probatório dos servidores públicos civis, ampliando o prazo de avaliação de dois para três anos, mas não alterou o estágio probatório de magistrados e membros do Ministério Público, fixado em dois anos (CF, Art. 95, I; 128, I, a). A Emenda assegurou ainda o prazo de dois anos para os servidores civis que se encontravam em período de estágio probatório na data da promulgação da Emenda (Art. 28). Os militares não têm a disciplina de aquisição da estabilidade regida pelo art. 41 da Constituição, mas por lei especial (Art. 142, X, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 18, de 5 de fevereiro de 1998). Atualmente, a estabilidade do praça é adquirida com 10 (dez) anos de tempo de efetivo exercício (art. 50 da Lei 6.880/80).

3 TEMÍSTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI, O Funcionário Público e o seu Estatuto, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1940, pág. 170.

4 J. GUIMARÃES MENEGALE, O Estatuto dos Funcionários, Vol. I, Rio de Janeiro, Forense, 1962, pág. 118.

5 J. CRETELLA JÚNIOR, Tratado de Direito Administrativo, Vol. IV, 1967, Forense, págs. 229.

6 Idem, ibidem, págs. 229.

7 Sobre o estágio experimental, conferir as observações de JESSÉ TORRES PEREIRA JUNIOR, Da Reforma Administrativa Constitucional, Rio de Janeiro, Renovar, 1999, pág. 245- 246 e JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, Direito Administrativo, 6ª. ed, Rio de Janeiro, Ed. Lúmen Júris, págs. 474-5. Convém anotar, porém, que a antiga compreensão do estágio probatório como continuação ou etapa final da seleção pública encontra ainda adeptos e respaldo até na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, como explicita a ementa do seguinte aresto: “Estágio probatório. Funcionário estável da Imprensa Nacional admitido, por concurso público, ao cargo de Agente de Polícia do Distrito Federal. Natureza, inerente ao estágio, de complemento do processo seletivo, sendo, igualmente, sua finalidade a de aferir a adaptabilidade do servidor ao desempenho de suas novas funções. Consequente possibilidade, durante o seu curso, de desistência do estágio, com retorno ao cargo de origem (art. 20, § 2º, da Lei nº 8.112-90). Inocorrência de ofensa ao princípio da autonomia das Unidades da Federação, por ser mantida pela União a Polícia Civil do Distrito Federal (Constituição, art. 21, XIV). Mandado de segurança deferido. (STF, MS 22933, DF, Tribunal Pleno, Relator Min. OCTAVIO GALLOTTI, Julgamento: 26/06/1998, DJ DATA-13/11/98 PP- 00005). Sobre a hipótese de recondução ao cargo de origem, com a desistência ou desaprovação em estágio, referida no acórdão, apoiada no § 2º, da Lei nº 8.112-90, ver os comentários feitos adiante.

8 OSWALDO ARANHA BANDEIRA DE MELLO, Princípios Gerais de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Forense, 1969, pág. 343; J. GUIMARÃES MENEGALE, ob. cit., 1962, pág. 119; CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, Regime dos Servidores da Administração Direta e Indireta (Direitos e Deveres), 3ª ed., São Paulo, Malheiros, 1995, pág. 103.

9 CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO define, com a costumeira precisão, provimento: “Provimento é o ato de designação de uma pessoa para titularizar um cargo público”. Segundo este autor, uma das principais classificações dos cargos públicos dividi-os conforme a sua vocação para a retenção dos ocupantes. Por este critério, os cargos públicos dividem-se em (a) cargos de provimento em comissão; (b) cargos de provimento efetivo; (c) cargos de provimento vitalício. Os dois últimos estão predispostos ao preenchimento por ocupantes definitivos, enquanto o primeiro é reservado para preenchimento por agentes sem vocação de fixidez, de livre designação e exoneração pela autoridade nomeante. A lei pode criar cargos de provimento em comissão ou de provimento efetivo, mas somente a Constituição pode enunciar os cargos vitalícios (Regime dos Servidores da Administração Direta e Indireta, 3a. ed, São Paulo, Malheiros, 1995, p. 29).

10 Dissente a doutrina quanto ao que entende por efetividade e efetivação. Para uns, efetivo é o cargo, sendo a efetividade uma característica do cargo público (ADILSON ABREU DALLARI, Regime Constitucional dos Servidores Públicos, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1990, p. 82); para outros, definitivo ou efetivo é o provimento do cargo, a investidura do agente (MÁRCIO CAMMAROSANO, Provimento de Cargos Públicos no Direito Brasileiro, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1984, p. 100). Adoto, no texto, o conceito de efetivação formulado por CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO: “A estabilidade em cargo de provimento efetivo é que se chama efetivação” (Curso de Direito Administrativo, São Paulo, Ed.

Malheiros, 13a. ed, 2001, p. 277). Porém, neste ponto, convém observar que o estatutoconstitucional contempla hipótese de estabilidade sem efetivação. É o caso da “estabilidade extraordinária” concedida pelo art. 19 do ADCT para os servidores que não ingressaram no serviço por concurso público, desde que contassem cinco anos continuados de exercício na administração direta, autárquica e das fundações públicas, contados na data da promulgação da Constituição de 1988. A hipótese confirma o conceito adotado, pois reclamava dos agentes estabilizados extraordinariamente, sem concurso público prévio, um concurso para sua “efetivação”. Donde se extrai que efetivação é a instalação definitiva do agente em cargo de provimento efetivo, sendo noção equivalente à de aquisição da estabilidade ou vitaliciedade, conforme o caso.

11 “Discute-se a respeito da situação jurídica do nomeado que se acha em período probatório. Segundo alguns, ainda não adquiriu a qualidade de funcionário público, o que só se dá após o seu término. Já outros o consideram como funcionário integrado no quadro, embora dependendo desse tempo ou prova para ser efetivado. Na verdade, a questão se resolve nos termos legais. Em face do direito pátrio, é funcionário, apesar de ficar em situação precária quanto à mantença no cargo, sujeito à exoneração, em reconhecida a sua falta de aptidão para o seu exercício. Aliás, é funcionário de cargo efetivo, por se tratar de nomeado para cargo de tal quadro, de natureza permanente, e que pede titular, outrossim, permanente. Não obstante a situação passível de transitoriedade, em virtude de achar-se em período de estágio probatório, salvo a situação jurídica de efetivado, todos os demais direitos e deveres lhes cabem, como os de qualquer funcionário efetivo e estável.”, OSWALDO ARANHA BANDEIRA DE MELLO, Princípios Gerais de Direito Administrativo, Vol. II, Rio de Janeiro, Ed Forense, 1969, pág. 343.

12 Esse panorama de perversão do instituto foi objeto de consideração de um número expressivo de autores. Destaco entre eles os seguintes: ANA LÚCIA BERBERT CASTRO, “Estágio Probatório – Distorção Prática de um Instituto”, In: Revista da Procuradoria Geral do Estado, v. 22, 1996, pág. 37-53; CARMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA, Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos, Saraiva, 1999, p. 237; JUAREZ FREITAS, “Emenda Constitucional 19/98 e a Avaliação Especial do Desempenho de Servidor Público em Estágio Probatório”, Revista Interesse Público, São Paulo, NotaDez, n º. 5, 2000, págs. 43-50; JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, ob.cit., pág. 473.

13 ADILSON ABREU DALLARI, comentando o regime original da Constituição de 1988, era enfático: “(...) aos funcionários nomeados em caráter efetivo, após concurso de provas ou de provas e títulos, é fatal a estabilização após dois anos de exercício. Ou seja, a aquisição da estabilidade se processa automaticamente; não depende de qualquer ato declaratório ou constitutivo” (Regime Constitucional dos Servidores Públicos, 2a. ed,.São Paulo, Revista dos Tribunais, 1990, pág. 81).

14 Embora a Constituição Federal de 1988, em sua redação original, deferisse a estabilidade constitucional apenas aos servidores investidos em cargos públicos, após aprovação em concurso público, quando completado o estágio probatório, com a ressalva apenas do disposto nos artigos 19 e 53 do ADCT, houve vacilação jurisprudencial em contrário, estendendo a aplicação da estabilidade constitucional ordinária também aos ocupantes de emprego público. A fundamentação recorrente para esta inteligência ampliativa do diploma constitucional era a redação original do art. 41, caput, que referia genericamente a servidores.

Vale observar que, também em sua redação original, o §1º. do art. 41 prescrevia: “O servidor público estável só perderá o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado ou mediante processo administrativo”. Os parágrafos subsequentes também tratavam unicamente de cargos públicos, disciplinando situações jurídicas decorrentes da invalidação da demissão, com o deslocamento do ocupante da vaga ao cargo de origem ou outro cargo ou posto em disponibilidade (art. 41, §2º.) ou situações decorrentes da declaração de extinção ou desnecessidade de cargo público (art.41, §3º). Sem embargo disso, o plenário do Supremo Tribunal Federal, no MS 21.236-5-DF, Rel. Min. SYDNEY SANCHES, julgado em 20/04/1995, publicado DJ DATA-25-08-95 PP-26022 EMENT VOL-1797 -02 PP-00315 e RT 722/347,

assentou que “1. A garantia constitucional da disponibilidade remunerada decorre daestabilidade no serviço público, que é assegurada, não apenas aos ocupantes de cargos, mas também aos de empregos públicos, já que o art. 41 da C.F. se refere genericamente a servidores. 2. A extinção de empregos públicos e a declaração de sua desnecessidade decorrem de juízo de conveniência e oportunidade formulado pela Administração Pública, prescindindo de lei ordinária que as discipline (art. 84, XXV, da C.F.)”. Posteriormente, no entanto, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE-167635/PA, pela segunda turma, assentou que a estabilidade prevista no referido artigo referia unicamente o servidor investido em cargo, enunciando "Estabilidade: artigos 41 da Constituição Federal e 19 do ADCT. A vigente Constituição estipulou duas modalidades de estabilidade no serviço público: a primeira, prevista no art. 41, é pressuposto inarredável à efetividade. A nomeação em caráter efetivo constitui-se em condição primordial para a aquisição da estabilidade, que é conferida ao funcionário público investido em cargo, para o qual foi nomeado em virtude de concurso público. A segunda, prevista no art. 19 do ADCT, é um favor constitucional conferido àquele servidor admitido sem concurso público há pelo menos cinco anos antes da promulgação da Constituição." (STF, RE 167635/PA, Relator Ministro MAURÍCIO CORREA, julgamento em 17/06/96, ementa publicada no DJ em 07/02/97, na página 01355). Mas primeira posição do Supremo Tribunal Federal fez durante muito tempo eco na Justiça do Trabalho, que passou a reconhecer a um número expressivo de servidores ocupantes de emprego público a possibilidade de acumularem simultaneamente os direitos decorrentes do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço e da estabilidade constitucional. O Supremo Tribunal Federal, entretanto, surpreendentemente, em nova oportunidade, regressou ao entendimento anterior, invocando o precedente do MS 21.236: “JUSTIÇA DO TRABALHO – DISPONIBILIDADE DE EMPREGADO PÚBLICO – O Plenário desta Corte, ao julgar o MS 21236, firmou o entendimento de que “a garantia constitucional da disponibilidade remunerada decorre da estabilidade no serviço público, que é assegurada não apenas aos ocupantes de cargos, mas também aos empregos públicos, já que o art. 41 da CF se refere genericamente a servidores. Dessa orientação divergiu o acórdão recorrido. Recurso extraordinário conhecido e provido. (STF – RE 247.678-1 – RJ – 1ª T. – Rel. Min. MOREIRA ALVES – Unânime – DJU 26.11.1999, p. 134)”. A nova redação do 41, caput, explicitando a exigência de provimento de cargo efetivo deve pacificar a jurisprudência.

15 Registro especial interesse por esta última alteração, que sugeri ainda no primeiro momento de discussão da reforma administrativa no interior do próprio Poder Executivo Federal. Trata-se de elemento essencial para eliminação da hipótese de vencimento do estágio probatório “por mero decurso de prazo”. Ao final, a exigência foi inserida no parágrafo 4º do art. 41 da Constituição Federal com a seguinte redação: “Como condição para a aquisição da estabilidade, é obrigatória a avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade”. Interpretando o novo dispositivo, CARMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA

sintetizou: “Essa condição constitucional – introduzida pela Emenda Constitucional n. 19/98 –fez-se no sentido de não permitir a continuidade da abulia administrativa em matéria de estágio. É que sem a avaliação o estágio era mera referência temporal na folha do servidor, sem qualquer compromisso concretamente arrostado administrativamente” (Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos, Saraiva, 1999, p. 237).

16 A Constituição da República dispõe, em seu art. 37, II, o seguinte: “a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração”. O dispositivo pode ser interpretado como uma determinação de formas distintas de provimento ou de tipos distintos de cargos públicos, caracterizados pela forma do provimento. São enfoques diferentes para compreensão do mesmo enredo normativo: o primeiro enfatiza o aspecto dinâmico do provimento; o segundo, o elemento estável dos cargos públicos. Na interpretação da disposição a doutrina tem encontrado campo para apenas dois tipos opostos de cargos públicos: de um lado, cargos vocacionados a provimento definitivo e rígido (cargos de provimento efetivo e cargos de provimento vitalício) e, de outro, cargos vocacionados a provimento transitório e flexível (cargos de confiança, de livre designação e exoneração). Lamentavelmente essa classificação tem sido recebida como dogma e é mencionada frequentemente como se esgotasse as hipóteses possíveis. Mas a Lei Fundamental, em outras disposições, parece ter fugido ao dilema entre cargos em comissão, de livre provimento e exoneração, e cargos de provimento em caráter definitivo, acedidos mediante concurso público. A Constituição encerra diversas hipóteses em que não há livre nomeação e exoneração, mas também não há exigência de concurso público. Na ausência de melhor designação, venho denominando essas hipóteses como de provimento condicionado ou exoneração condicionada, uma vez que, embora prescindam de concurso público, apresentam como peculiaridade negar a livre nomeação, a livre destituição ou as duas decisões discricionárias típicas dos cargos em comissão. Exemplos não faltam: Presidente e diretores do Banco Central (Art. 52, III, d); Governador de Território (art. 52, III, c); Procurador-Geral da República (Art. 52, III, e); titulares de cargos que a lei determinar (art. 52, III, f); Ministros dos Tribunais de Contas, indicados pelo Presidente da República (art. 52, III, b); magistrados escolhidos pelo Poder Executivo, nos casos estabelecidos na Constituição (art. 52, III, a).

O número de cargos de provimento ou desligamento condicionado não cessa deaumentar, tendo em vista a cláusula aberta do art. 52, III, f, que delega à lei prever novas hipóteses de prévia aprovação do Senado Federal para nomeação de agentes públicos. A previsão tem sido aplicada com frequência para os diretores de Agências Reguladoras, cuja designação tem prescindido de concurso público, exigido a concordância do Senado Federal e conferido ao titular, durante um certo lapso de tempo, garantias semelhantes à estabilidade dos servidores ocupantes de cargos de provimento efetivo (cf., v.g., Lei n. 9.427/96, art. 5o, caput e parágrafo único; Lei n º 9.472/97, art. 8o, §2o, 23 e segs; Lei no. 9478/97, art. 11, §2o e 3o.; Lei n. 9.986/2000, art. 5o. e segs.)

17 ESTABILIDADE EXCEPCIONAL (ADCT, ART. 19) – I – Reconhecida a continuidade dos períodos sucessivos de serviço, não obsta à estabilidade a falta ao trabalho nos dois últimos dias do primeiro: a assiduidade absoluta não foi erigida em requisito essencial de estabilidade do art. 19 das Disposições Transitórias. II – Estabilidade excepcional (Art. 19 do ADCT): não implica efetividade no cargo, dependente de concurso interno. (STF – RE 187.955-6 – SP – 1ª T. – Rel. Min. Sepúlveda Pertence – Unânime – DJU 05.11.1999, p. 27).

18 Conquanto não tenha a Emenda Constitucional n. 19 explicitado para as hipóteses de aquisição da vitaliciedade a exigência constante do §4o do art. 41, vale dizer, a indispensável avaliação de desempenho por comissão instituída para essa finalidade, não parece razoável admitir-se como juridicamente legitimadas as concessões de vitaliciedade por mero decurso de prazo. Se a estabilidade é garantia de menor expressão do que a vitaliciedade e, por expressa exigência constitucional (exigência que também sintetiza um valor agasalhado pelo sistema), pressupõe efetiva avaliação de aptidão, parece incongruência admitir-se aquisição de vitaliciedade sem a correspondente avaliação de aptidão. Essa exigência deve ser admitida como implícita ante o novo contexto sistêmico estabelecido a partir da emenda constitucional n. 19.

19 Cf. “Estágio Probatório dos Servidores Públicos”, in Revista Trimestral de Direito Público (RTDP), n. 5, São Paulo, Malheiros, 1994, págs. 179-187.

20 STJ: “RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR EM ESTÁGIO PROBATÓRIO APROVADO EM OUTRO CONCURSO PÚBLICO. AFASTAMENTO DO CARGO EFETIVO. PARTICIPAÇÃO NO CURSO DE FORMAÇÃO SEM PREJUÍZO DOS VENCIMENTOS DO CARGO. POSSIBILIDADE. A legislação não dispõe que o estágio probatório se dará num período de 24 meses corrido, e sim, em efetivo exercício em tal período. Por sua vez, a legislação referente ao ingresso no novo cargo, permite ao já ocupante de cargo efetivo, o direito de opção pelo respectivo vencimento durante o curso de formação. Precedente análogo. Recurso desprovido. (STJ, RESP 173580, DF, Data de Decisão: 23/11/1999, QUINTA TURMA, Nome do Ministro Relator: JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, Fonte: DJ DATA:17/12/1999 PG:00391)

21 CARMEM LÚCIA ANTUNES ROCHA adota critério distinto, mais fluido, pois recusa considerar como tempo de exercício efetivo apenas os afastamentos de “período tão prolongado que impeça a avaliação competente” (ob. cit., p.232). No entanto, quando detalha as hipóteses em que o período de contagem do tempo de serviço efetivo deve ser suspenso, refere hipóteses semelhantes às indicadas: “Note-se, de resto, que, às vezes, o servidor é considerado no efetivo exercício, conquanto fisicamente afastado do desempenho das funções que lhe são conferidas, para alguns casos legalmente previstos e não para outros. Assim, por exemplo, as licenças para tratamento de saúde são consideradas de efetivo exercício para a contagem de tempo para aposentadoria, mas não para a aquisição da estabilidade, quando se configurar um período tão prolongado que impeça a avaliação competente e, agora, obrigatória e periódica do desempenho. Mesmo não contribuindo para o seu afastamento e havendo um motivo justo, como é o de tratamento de saúde, o servidor fica impossibilitado de ser competentemente avaliado em seu desempenho pelo período necessário para a conclusão, que conduzirá, ou não, à estabilização do vínculo com a pessoa pública. Logo, tal afastamento não pode ser computado como estando ele em efetivo exercício para os parâmetros constitucionais referentes à estabilidade” (idem, p. 232). Na União, a Lei 8.112/90, alterada pela Lei 9.527/97, indicou no §5o. do seu art. 20 algumas hipóteses de necessária suspensão da contagem do período de exercício no curso do estágio probatório: (a) licença por motivo de doença em pessoa de família (art. 83); (b) licença por motivo de afastamento de cônjuge (art.84, §1º.); (c) licença para atividade política (art. 86); (d) afastamento para servir em organismo internacional de que o Brasil participe ou com o qual coopere (art. 96). Entendo que essas hipóteses não são exaustivas, podendo ser figuradas outras, com vistas a assegurar a finalidade constitucional de avaliação dos servidores no curso do estágio probatório: (a) designação para cargos de confiança; (b) licença para serviço militar; (c) licença para tratar de interesses particulares; (d) licença para desempenho de mandato classista, entre outras hipóteses.

22 “(...) A estabilidade é a garantia constitucional de permanência no serviço público outorgada ao servidor que, nomeado por concurso público em caráter efetivo, tenha transposto o estágio probatório de dois anos (art. 100, EC-01/69; art. 41 da CF/88). O estágio, pois, é o período de exercício do funcionário durante o qual é observada e apurada pela Administração a conveniência ou não de sua permanência no serviço público, mediante a verificação dos requisitos estabelecidos em lei para a aquisição da estabilidade. Para esse estágio só se conta o tempo de nomeação efetiva na mesma Administração, não sendo computável o tempo de serviço prestado em outra unidade estatal, nem o período de exercício de função pública a título provisório. (...) Disposição de Lei Municipal que assegura, para fins de estágio probatório, a contagem do tempo de serviço na interinidade, no mesmo cargo, ou o tempo de serviço prestado em outros cargos de provimento efetivo, desde que não tenha havido solução de continuidade (Estatuto dos Funcionários Públicos Municipais de Congonhal - Lei nº 90, de 26 de novembro de 1958). Autonomia constitucional das entidades estatais. Norma discrepante com os preceitos inscritos na EC-01/69, então vigente. (..) o instituto da estabilidade, que, a par de um direito, para o servidor, de permanência no serviço público enquanto bem servir, representa para a Administração a garantia de que nenhum servidor nomeado por concurso poderá subtrair-se ao estágio probatório de dois anos. Por isto, não pode a Administração federal, estadual ou municipal ampliar o prazo fixado pelo Texto Constitucional, porque estaria restringindo direito do servidor público; mas também não pode diminuí-lo ou estendê-lo a outros servidores que não os nomeados por concurso, porquanto estaria renunciando a prerrogativas constitucionais consideradas essenciais na relação Estado-agente administrativo. Não sendo lícito ao ente federado renunciar a essas prerrogativas, nula e de nenhum efeito disposição estatutária em desacordo com o preceito constitucional. (...)”(STF, RE 0170665, Segunda Turma, Relator Min. MAURICIO CORREA, data do julgamento 27/09/1996, publicação DJ DATA-28/11/96 PP-47175). (Grifo nosso)

23 O que fazer, porém, quando o agente, para o mesmo cargo, perante a mesma pessoa jurídica, presta novo concurso público e vem a ser investido em cargo efetivo idêntico ao que já exercita na condição de estável? A hipótese não é absurda: penso em professora primária, ocupante de cargo efetivo em determinado Município, já estabilizada, habilitada pela Constituição a acumular dois cargos de professora e que resolve prestar novo concurso para outro cargo de professora municipal, obtendo aprovação e investindo-se no novo cargo. A rigor, não deveria haver nova avaliação especial de desempenho, desde que efetuada avaliação no cargo anterior com perfeita identidade de função. Mas não é o que tem entendido o Supremo Tribunal Federal, pois o excelso pretório tem recusado validade a todas as leis estaduais que reduziram ou eliminaram o tempo de estágio ou a exigência da avaliação no estágio em caso de agente que já exercia de modo estável cargo idêntico ou semelhante. Exemplo deste entendimento: CONSTITUCIONAL. CUMULACAO DE DOIS CARGOS DE PROFESSOR. LEI ESTADUAL, DE INICIATIVA DE PARLAMENTAR, DISPENSANDO A SUJEIÇÃO DO SERVIDOR A NOVO ESTAGIO PROBATORIO. Relevância jurídica da tese de inconstitucionalidade formal e material, por violação, respectivamente, aos arts. 61, PAR. 1., II, C, e 41, da Carta Federal. Configuração do periculum in mora ante a possibilidade de que, independentemente de estágio probatório, sejam estabilizados servidores públicos. Medida liminar deferida. (STF, ADIn 919, PR, TRIBUNAL PLENO, Relator: Min. ILMAR GALVAO, data do julgamento 08/10/1993, publicação DJ DATA-03/12/93 PP-26356, confira também ADIn-89 e ADIn-872.)

24 “Emenda Constitucional 19/98 e a Avaliação Especial do Desempenho de Servidor Público em Estágio Probatório”, in: Revista Interesse Público, N. 5, São Paulo, Ed. Notadez, 2000, pág. 44.

25 JUAREZ FREITAS, em uma das conversas informais que mantivemos durante as saborosas noites do CONGRESSO BRASILEIRO DE DO ESTADO, formulou outra hipótese de interesse para a matéria: ante a inércia danosa da Administração, violadora do direito à avaliação, o servidor em estágio deveria ser resguardado da exoneração prioritária prevista pelo inciso III do art. 169 da Constituição (hipótese de desligamento por excesso de quadros, ou melhor, excesso de despesa), sendo assimilado aos demais servidores estáveis até a efetiva realização da avaliação exigida para conclusão do estágio probatório. É outra hipótese engenhosa, que não havia cogitado anteriormente, mas que merece igual acolhida como forma de atenuação de eventuais danos provocados pela inércia da administração na matéria.

26 Sobre o direito à carreira, também denominado direito à evolução funcional, conferir as sempre precisas observações do Prof. ADILSON ABREU DALLARI, Regime Constitucional dos Servidores Públicos, ob. cit. cap. 5, pp. 51- 54.

27 Nos Tribunais a matéria não tem sido ventilada. O único precedente que tenho notícia é do Superior Tribunal de Justiça: “CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MEMBROS DO MINISTERIO PUBLICO. VITALICIEDADE. INTERSTICIO. –(…) Processo administrativo. Legalidade de sua instauração para apuração de falta funcional grave, quanto mais que improcedente o óbice da vitaliciedade, ainda não alcançada por carência do requisito constitucional do interstício (cf, art. 128, parágrafo 5., inciso i, letra "a"); exigência que não se releva pelo fato de uma antecipada promoção na carreira funcional.”(STJ, ROMS 4738/AP, DJ DATA:02/10/1995, PG:32390, Relator Min. JOSÉ DANTAS, Data da Decisão 06/09/1995,Orgão Julgador T5 - QUINTA TURMA).

28 A proibição de ir contra os próprios atos interdita o exercício de direitos subjetivos ou prerrogativas unilaterais quando o agente procura emitir novo ato em contradição manifesta com o sentido objetivo dos seus atos anteriores, ferindo o dever de coerência para com o outro sujeito da relação sem apresentar justificação razoável. É uma decorrência direta da tutela da boa-fé, exigível também da Administração Pública, em face do princípio da moralidade (CF, art. 37, caput). Sobre o tema, inclusive com referência jurisprudencial, conferir texto base da exposição que fizemos no I Congresso Mineiro de Direito Administrativo, na sessão do dia 30.11.1994., sob o tema “Controle Jurídico do Comportamento Ético da Administração Pública no Brasil”, publicado na RDA. Na literatura estrangeira, conf. ALEJANDRO BORDA, La Teoria de los Actos Propios, 2º ed, Buenos Aires, Abeledo-Perrot, 1993; JOSÉ PUIG BRUTAU. “Actos Propios”, In: Nueva Enciclopedia Jurídica, Tomo II, Barcelona, Francisco Seix Editor, 1950; LUIS DÍEZ-PICAZO, La Doctrina de Los Propios Actos: un estúdio crítico sobre la jurisprudencia del Tribunal Supremo, Barcelona, Ed. Bosch, 1963; EDUARDO GARCÍA DE ENTERRÍA, “La Doctrina de los Actos Propios e el Sistema de la Lesividad”, In: Revista de Administración Publica, Madrid, Instituto de Estudios Políticos, a. VII, n. 20, mayo/agosto, 1956; LAUREANO LÓPEZ RODÓ, “Pesupuestos Subjetivos para la Aplicación del Principio que Prohibe Ir Contra los Propios Actos”, In: Revista de Administración Publica, Madrid, Instituto de Estudios Políticos, a. III, n. 9, set./dez, 1952.

29 Ementa: NOMEAÇÃO DE SERVIDOR, EM ESTÁGIO PROBATÓRIO, PARA CARGO DE CONFIANÇA. I- A Constituição Federal não estabelece óbice à nomeação de servidor - integrante de quadro de carreira técnica ou profissional e que esteja no período do estágio probatório - para o exercício de funções de confiança (cargo comissionado ou função gratificada). No entanto, nos termos do preconizado pela Lei Maior, artigo 37, I, norma infraconstitucional poderá estabelecer requisitos para o provimento destas funções de confiança, dentre os quais poderá figurar a exigência do cumprimento do estágio probatório. Na hipótese de não haver vedação de natureza legal, a nomeação deste servidor - no curso do estágio probatório, para exercer funções de confiança - implicará a SUSPENSÃO do período probatório, que só voltará a ser computado a partir do retorno do servidor ao exercício do cargo efetivo. Neste caso, se o servidor não for estável no serviço público, a suspensão do estágio probatório implicará, necessariamente, a suspensão da contagem do tempo de serviço para efeito da estabilidade funcional. Só após o cumprimento integral do estágio probatório, onde a autoridade administrativa terá a oportunidade de aferir a sua aptidão (assiduidade, idoneidade moral, eficiência, etc.) para o exercício do cargo efetivo, é que o servidor poderá ser considerado estabilizado no serviço público. Sendo, contudo, o servidor já detentor de estabilidade funcional - em decorrência do exercício de cargo efetivo anterior, no âmbito do mesmo Ente Estatal e sem que tenha havido solução de continuidade entre os dois provimentos efetivos - não haverá alteração na sua estabilidade funcional, de sorte que apenas o período probatório ficará suspenso. Ressalte-se, por fim, que na hipótese de haver MANIFESTA CORRELAÇÃO entre as atribuições das funções de confiança e as atribuições do cargo efetivo do servidor, não há que se falar em suspensão do estágio probatório nem da contagem do prazo para efeito de estabilidade funcional. II- Nos termos do artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (C.F.), é considerado estável no serviço público, só podendo ser demitido em razão de processo administrativo ou sentença judicial irrecorrível, o servidor que em 05 de outubro de 1988 (data da promulgação da Lei Maior) contasse com pelo menos 05 (cinco) anos de tempo de serviço público (TCE-PE, Decisão T.C. N: 0408/96, ÓRGÃO JULGADO: FAC.DE FORM.DE PROFES.DE BELO JARDIM-PRESIDENTE, Data Publicação: 11/04/96)

30 Direito Administrativo, 5ª.ed, São Paulo, Saraiva, 2000, p. 181.

31 A Lei 9.527/97 introduziu um parágrafo terceiro no art. 20 na Lei 8.112/90 autorizando expressamente a designação de servidores em estágio probatório, verbis: “Art. 20, §3º.O servidor em estágio probatório poderá exercer quaisquer cargos de provimento em comissão ou funções de direção, chefia ou assessoramento no órgão ou entidade de lotação, e somente poderá ser cedido a outro órgão ou entidade para ocupar cargos de Natureza Especial, cargos de provimento em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores – DA, de níveis 6, 5 e 4, ou equivalentes”.

32 Dois acórdãos ilustram essas duas linhas de argumentação. O primeiro: “O servidor público em estágio probatório, ainda que exercendo cargo de direção ou representação sindical, não tem direito à estabilidade sindical (CF, art. 8º, VIII), tendo em vista a omissão deste dispositivo na remissão constante do art. 39, § 2º, da CF, assim como a incompatibilidade do sistema dos servidores públicos com o sistema dos empregados regulados pela legislação trabalhista quanto ao instituto da estabilidade. Com base nesse entendimento, a Turma, por maioria, manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul para afastar a tese da recorrente — que fora exonerada, por inaptidão para o serviço público, do cargo de atendente de creche de prefeitura municipal —, no sentido de se emprestar interpretação extensiva ao art. 8º, VIII, da CF. Vencido o Min. Sepúlveda Pertence, sob o entendimento de que a estabilidade sindical prevista no art. 8º, VIII, da CF é garantia conferida ao sindicato e não ao trabalhador. (STF, RE 204.625 RS, rel. Min. Octavio Gallotti, 02.10.98”, Observação: retirado do Informativo N.125 do STF). O segundo:

“ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. ESTABILIDADE SINDICAL. A Constituição,conquanto haja estendido ao servidor público o exercício de prerrogativas próprias do empregado regido pelo direito comum do trabalho (art. 39, § 2º), cuidou de estabelecer limitações indispensáveis a que o exercício de tais direitos não entre em choque com as vigas mestras do regime administrativo que preside as relações funcionais, entre essas, a relativa à estabilidade sindical do art. 8o., VIII, que importaria a supressão do estágio probatório, a que estão sujeitos todos os servidores. Recurso não conhecido (STF, RE 208436-RS, Relator: ILMAR GALVAO, Primeira Turma, Data do Julgamento: 13/10/1998 Publicação: DJ DATA- 26/03/99 PP-00017 EMENT VOL-01944-04 PP-00856)

33 Cf., por todos, PALHARES MORAIS REIS, Os Servidores, A Constituição e o Regime Jurídico Único, Brasília, Centro Técnico de Administração Ltda, 1993, pág. 68.

34 Cf., por todos, JUAREZ FREITAS, ob. cit., pág.45.

35 Ementa: ESTAGIO PROBATORIO. Se o ato de exoneração é praticado depois de expirado o período probatório fixado em lei, quando já consumada a confirmação do funcionário no serviço público, ofende-lhe direito líquido e certo e não pode prevalecer. Segurança concedida. (STF, MS 19953, DF, TRIBUNAL PLENO, Relator: Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE, Publicação: DJ DATA-15/06/73 PG-04327 EMENT VOL-00914-01 PG- 00151, RTJ VOL-00067-03 PG-00380, data do Julgamento: 09/05/1973).

36 STJ: “SERVIDOR PÚBLICO. ESTÁGIO PROBATÓRIO. LEI Nº 8.112/90, ART. 20, § 1º. PERÍODO DE AVALIAÇÃO. EXONERAÇÃO. SÚMULA 21 DO STF.1. O período de avaliação do servidor, chamado de estágio probatório, inicia-se com sua entrada em exercício e se estende até o vigésimo quarto mês, sendo que no vigésimo mês é submetida à Administração uma avaliação, que poderá ser homologada, ou não, dentro do período de quatro meses (Lei nº 8.112/90, Art. 20, § 1º), ultrapassados os quais impõem-se que a apuração ou avaliação sejam efetivadas em um processo administrativo no qual se obedeça os princípios do contraditório e da ampla defesa, sob pena de ampliar-se o prazo legal do estágio probatório sem justificativa plausível. 2 Iniciado processo administrativo para formalizar a exoneração do servidor que não alcançou o número suficiente de pontos, no qual observou-se o devido processo legal, ainda que logo após vencido o prazo de vinte meses e só findo após o do decurso do prazo total do estágio probatório, não há falar-se em ilegalidade do ato administrativo. 3. Recurso a que se nega provimento. (STJ, ROMS 9946, DF, data da decisão: 17/08/1999, QUINTA TURMA, Ministro Relator: EDSON VIDIGAL, Fonte: DJ DATA:20/09/1999 PG:00073)“

37 Ementa: Estágio probatório. Funcionário estável da Imprensa Nacional admitido, por concurso público, ao cargo de Agente de Polícia do Distrito Federal. Natureza, inerente ao estágio, de complemento do processo seletivo, sendo, igualmente, sua finalidade a de aferir a adaptabilidade do servidor ao desempenho de suas novas funções. Consequente possibilidade, durante o seu curso, de desistência do estágio, com retorno ao cargo de origem (art. 20, § 2º, da Lei nº 8.112-90). Inocorrência de ofensa ao princípio da autonomia das Unidades da Federação, por ser mantida pela União a Polícia Civil do Distrito Federal (Constituição, art. 21, XIV). Mandado de segurança deferido. (STF, MS 22933, DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI, data do Julgamento: 26/06/1998, publicação: DJ DATA- 13/11/98 PP-00005 EMENT VOL-01931-01 PP-00169

38 Basta observar que, acertadamente, após a Constituição Federal de 1988, o Supremo Tribunal Federal tem recusado validade a todas as formas de provimento derivado não decorrentes de promoção, tais como os antigos institutos da ascensão funcional, a transformação de cargos e o aproveitamento. Conf. ADIN 231-RJ, RTJ 144/24; ADIN 248-1, RDA 196/107; ADIN 89-MG, RTJ 150/341; ADIN 1.329-7-AL, RDA 207/219; ADIN 308-DF, RTJ 152/361; ADIN 112-BA, RTJ 157/737. “A regra geral, estabelecida pela Constituição Federal, para a investidura em caros ou empregos públicos é a aprovação prévia em concurso público, art. 37, II. As exceções estão expressamente previstas”. (STF, ADIN 979, RDA 199/246).

39 PONTES DE MIRANDA, Comentário à Constituição de 1967, com a Emenda n. 1, de 1969, Tomo III, Rio de Janeiro, Forense, 1987, pág. 453.



Resumo Inglês: